segunda-feira, 20 de abril de 2020

Não é brinquedo, não...


Quem me conhece, sabe que eu coleciono Comandos em Ação, G.I.Joes 1:18 e 1:6 e Falcon. 

Falcon acho que desde 1979-80...  embora eu não tenha nenhum dessa época. Quebraram, minha mãe mandou arrumar no hospital das bonecas, e ela nunca foi buscar. E, com certeza, o cara passou adiante. Fiquei com os do relançamento de 94. 

Comandos em Ação, desde o primeiro, em 1984. E nunca parei. Em meados do anos 90, surgiu o iBazar, junto com o surgimento da internet no Brasil e descobri como era o lance lá fora. Conheci vendedores. E fui amaldiçoado com a coleção de G.I.Joe dos EUA que nunca acaba.

E Hasbro faz de tudo para ficar com o meu dinheiro.

Um dia, uma mulher com quem eu estava saindo, me perguntou: "mas você brinca com eles?" E foi só a primeira. Ouvi de muitas. 

E eu respondi que sim. Ela riu, claro. E ela, com certeza, me imaginou deitado no carpete fazendo som de tiro com a boca e colocando os bonequinhos para brigar. E depois ela me confirmou que pensou isso mesmo.

Aí eu fui por partes.

Primeiro, não tenho carpete. Segundo, com 1,90m e muitos quilos acima dos 100, não tem espaço algum na minha casa onde possa ficar esparramado no chão. Até tem, mas só pra um ou para o outro. Eu e os bonecos ao mesmo tempo, não dá.

Segundo, a parte mais triste, eu também cresci como pessoa, por mais que alguns indivíduos insistam na tese contrária. Quando você é criança, escolhe os bonecos que você mais gosta. Ou escolhe todos, como eu sempre fazia. E passa o dia montando e arrumando, armando os bonecos e preparando os veículos. Aí você começa a brincar, fica uma hora, duas... e o dia acaba. Mas quando você se torna adulto, pára de fazer o som dos tiros e das explosões com e boca além de dar voz a todos os bonecos. E, na sequencia:

a) você descobre que o G.I.Joe/Comandos em Ação é uma equipe especial tática, que age com esquadrões de 4 a 12 elementos cujas habilidades são complementares e mescladas para executar uma determinada missão. E que mais de um esquadrão, forma um pelotão e que esses esquadrões deverão agir de forma complementar para realizar a missão;

b) Uma vez sabendo de "a", você precisa juntar os especialistas certos para missão que você planejou e para isso é necessário buscar o filecard do personagem para saber as habilidades e aptidões dele, que no desenho variavam, nos quadrinhos não tinha muito porque saiu pouco no Brasil e o filecard nacional da Estrela não era realmente um modelo de exatidão;

c) Depois de estabelecidos "a" e "b", saber dos veículos envolvidos e das tropas inimigas que serão utilizadas. A gente sempre quer usar todas, e por isso monta exércitos de vários iguais. A gente vira army builder. Eu mesmo devo ter uns 40 Cobra Troopers e mais um tanto de Vipers. Fora os especialistas.

d) Procurar a área ficou a mais dramática das situações. Porque você cresce, estuda o assunto e descobre que os combates com armas leves ocorrem em distâncias gerais que variam de 100m a 200m. Numa escala 1:18, isso pode ser de até 1,5m de distância de uma figura armada para outra. Lá se vai uma sala inteira. Se você for utilizar tanques e outros veículos blindados piora: combates entre carros de combate dificilmente se dão à queima-roupa, podendo ser uma média de 5km entre eles, no geral 3km. Lá se foi um terreno de 30m. Mas sempre se pode simular combate urbano para reduzir essas distâncias e fazer uns close combats. Nem falemos de combates aéreos e a necessidade de espaço que um F-14 precisa para fazer um curva. Combate naval? 15km. E pode ser até além da linha de visão. Um míssil Harpoon estadunidense tem alcance de 124km. O tanque de lavar roupa da sua mãe não serve mais. Uma piscina, talvez? E ninguém quer perder armas e figuras na lagoa do sítio do não-sei-quem. Esqueça peças de artilharia. Obuses acertam alvos à 15km e até 30 com munição assistida por foguete;

e) O conhecimento de armas leves e táticas de movimentação, infiltração e reconhecimento te fazem querer descartar mais da metade das armar originais dos bonecos, que não existem, não são práticas ou são tão fora de escala que é impossível uma figura transportar, municiar e disparar uma arma daquelas. Os SAW Vipers que o digam. E arma sem carregador, então? Arma de ferrolho sem ferrolho...

f) Descobrir que camuflagem é a alma do negócio e que as modernas guerras mudaram tudo, e te fazer perguntar por que um soldado se vestiria de vermelho. Ou verde limão. Ou rosa. Rosa shok. Laranja flúor  Verde, amarelo e laranja. Flúor. Aí você quer pintar tudo de cores que o mundo real aceitaria. Nada de transformar seu soldado num enorme cartaz de "shot me". E aí você vira customizador. E vira artista para recriar os padrões reais de camuflagem e agradece todos os dias pelo marauderinc existir.

g) Com tudo acima pronto, você percebe que não tem tempo. Arma tudo durante semanas. E até tem que tirar o pó das primeiras figuras que posicionou. E no fim, acaba apenas fotografando tudo para por no facebook e talvez criar uma dio-história. Quando tiver tempo, claro. E depois passar outro tempão guardando tudo. No meu caso, trabalho o dia todo e quando chego em casa ainda tenho que sempre fazer janta para ter almoço no dia seguinte, lavar louça, lavar roupa. Morar sozinho exige seu tempo para outras coisas.

Não existe maneira de ser criança novamente, embora a vontade de brincar nunca vá embora.

E eu nunca vou deixar de agradecer o fato de G.I.Joe e Comandos em Ação além do Falcon existirem.

Trabalho com informática e sou professor. Mas aprendi história por causa do brinquedo. Aprendi geografia por causa do brinquedo. Carai... que criança de 10 anos, nos anos 80, sabia o que era e onde ficava aquela porra de Afeganistão? Aprendi física, balística, um pouco de química e engenharia de materiais. Fui descobrir como fazer cálculo de lastro para embarcações para construir uma plataforma marítima funcional com canos PVC na escala. Criei métodos para utilizar materiais diversos. Composição de tintas para não derreter o plástico. Os melhores adesivos. Usar uma micro-retífica e outras ferramentas de precisão. Esculpir epóxi, massa de biscuit, argila. Trabalhar com madeira. Aprendi a costurar para fazer sacos de areia para barricadas e fortificações (minhas meias agradecem, é o mesmo ponto). Cálculo de escala.

E o inglês? Como esquecer que vencer a barreira do idioma para ler os quadrinhos, os filecards gringos, os sites de colecionismo, os livros, os desenhos, os documentários. O aprendizado do idioma veio primeiro por essa necessidade, tanto quanto da necessidade profissional, Ler manuais de informática é uma coisa, mas negociar no e-bay é outra.

Eu poderia passar o dia escrevendo tudo que aprendi para, de uma maneira ou de outra, usar com os bonecos, e ainda assim ia faltar algo. Mas só posso dizer que sou o que sou porque eu queria brincar melhor. E a brincadeira ficou séria e perdeu um pouco da graça, embora não da paixão, do gosto, do amor que cresceu comigo. Tudo isso é parte do pacote que eu sou.

É lembrando de tudo isso que você dá o próximo passo: você mesmo ser o G.I.Joe!

Começa a praticar arco e flecha. Airsoft. Tiro ao alvo. Fazer trilha. E se vestir de roupa VO ou camuflada. Ou a grande moda: farda preta. É isso aí, parceiro. A nossa farda é preta.

E sim... tamo tudo G.I.Joe acima do peso... hahauahauhauahuahuahuahauhau

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